Campo Grande, 10 de dezembro de 2024

Estudo estima que novo Complexo do Ibirapuera pagaria R$ 737 mi de IPTU, mas shopping e hotel previstos em concessão serão isentos

A concessionária que administrará o novo Complexo do Ibirapuera, na Zona Sul de São Paulo, não pagará mais de R$ 737 milhões à Prefeitura de São Paulo devido à isenção do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) por utilizar um terreno que é público. É o que aponta projeção feita por uma consultoria a pedido de associação de moradores da região.

O valor representa 76,6% do investimento total de R$ 962,4 milhões por parte da iniciativa privada previsto pelo governo do estado durante o período de 35 anos da concessão.

Embora o Complexo Desportivo Constâncio Vaz Guimarães, mais conhecido pelo Ginásio do Ibirapuera, seja gerido pelo governo estadual, ele está em um terreno que pertence à Prefeitura de São Paulo com cerca de 100 mil m² em uma área nobre da cidade.

Atualmente, o imposto não é cobrado do estado porque o equipamento tem finalidade pública e é voltado exclusivamente para a prática de esportes. No entanto, entidades defendem que o modelo de concessão proposto, embora mantenha áreas esportivas, mudará a finalidade principal para exploração privada.

O plano da gestão João Doria (PSDB) para modernização do complexo prevê, além da construção de uma arena multiuso para 20 mil pessoas, também outros edifícios comerciais privados como um shopping, um hotel quatro estrelas e um estacionamento que pode cobrar até R$ 70 em dias de evento.

O relatório financeiro que foi utilizado para fundamentar a concessão estima que a iniciativa privada possa lucrar até R$ 2 bilhões com o empreendimento. Já o total previsto de outorga a ser paga aos cofres públicos é de R$ 155 milhões. Os valores ainda podem sofrer alterações no texto final do edital, mas são usados como base para a negociação.

Para a Associação dos Amigos da Praça da Rua Curitiba e Entorno (Aprace), uma das entidades que é contra o projeto, o modelo não apresenta contrapartida para a população que justifique o “subsídio” do poder público com a isenção dos impostos.

“No entorno já temos pelo menos cinco shoppings. Aí o cara recebe o terreno de graça, depois vai ter uma isenção de IPTU. Cria, inclusive, uma concorrência desleal. Fora que uma arena para shows, um hotel e apartamentos de altíssimo luxo onde o preço do m² chega a R$ 35 mil. No que está beneficiando a população?”, diz Douglas Melhem Junior, presidente da Aprace.

Além de não pagar IPTU, os novos prédios no complexo também serão isentos de Outorga Onerosa do Direito de Construir (OODC).

Estudo de impacto

 

Projeto do governo de São Paulo para a modernização do Complexo Esportivo Constâncio Vaz Guimarães, no Ibirapuera, Zona Sul de São Paulo. — Foto: Reprodução

Projeto do governo de São Paulo para a modernização do Complexo Esportivo Constâncio Vaz Guimarães, no Ibirapuera, Zona Sul de São Paulo. — Foto: Reprodução

A estimativa para o valor do IPTU foi realizada pela consultoria ODX em um estudo de impacto que analisa dados públicos da cidade e informações da concessão disponibilizados até agora.

De acordo com o cientista de dados Felício Visnardi, foi adotada uma taxa conservadora de 3% de reajuste anual para o imposto. O valor real, portanto, pode ser ainda maior.

“Se pegar alguns anos com base maior do que 3%, esse valor cresce e dá um impacto grande no final. Foi anunciado como um grande favor para a sociedade, mas na verdade a sociedade vai pagar boa parte da conta”, diz Visnardi.

De acordo com o estudo, não há justificativa legal para manter as mesmas isenções de quando a área era destinada apenas para fins públicos.

“Se o objetivo do governo paulista, ao realizar a concessão do Complexo Constâncio Vaz Guimarães, era o de reduzir o gasto público, esse formato representa o oposto disso, criando uma espécie de subsídio velado ao investidor do projeto e de difícil justificativa ou amparo legal”, diz o relatório.

 

G1 questionou a Prefeitura de São Paulo sobre a continuidade de isenção do imposto mesmo com a mudança da destinação da área após a concessão. Em nota, a gestão municipal afirmou que “não haverá incidência de IPTU porque a área citada pertence ao Município; do contrário, haveria autotributação”.

A administração negou um suposto prejuízo em relação à área “uma vez que não há, mesmo antes da concessão, incidência de IPTU”.

Na opinião do advogado especialista em urbanismo, Marcelo Magnani, o modelo de concessão apresentado impede de fato que o imposto seja cobrado, uma vez que o terreno continua pertencendo à prefeitura.

Magnani aponta, no entanto, que o cálculo deveria ter sido considerado para definir o valor final da outorga a ser paga pela concessionária.

“A prefeitura não pode mesmo se ‘autotributar’. Embora não tenha possibilidade de cobrança de IPTU, é possível estimar o quanto seria o imposto e esse é um cálculo importante na hora de receber pela concessão. As entidades podem se manifestar para que seja avaliado o valor da outorga, há base legal para esse questionamento”, afirma.

 

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