Troca de e-mails mostra também as tentativas feitas para retirar o primeiro conjunto de joias, apreendido pela Receita Federal no Aeroporto de Guarulhos. A defesa de Cid afirmou que não pode se manifestar sobre o caso porque não teve acesso aos documentos.
Por Pedro Figueiredo
O blog teve acesso ao novo conjunto de e-mails de Mauro Cid obtido pela CPI dos Atos Golpistas. Neles, é possível encontrar documentos que apontam que a Ajudância de Ordens da Presidência da República teve acesso aos certificados de um segundo conjunto de joias entregues pelo governo da Arábia Saudita e que entrou no Brasil. As mensagens revelam também as tentativas de retirada do primeiro conjunto de joias, apreendido pela Receita Federal no Aeroporto de Guarulhos.
Em 19 de dezembro do ano passado, Mauro Cid digitalizou quatro certificados da marca Chopard:
- O primeiro é um anel de 24 diamantes;
- O segundo é um masbaha, item semelhante a um rosário usado por islâmicos, com 110 diamantes;
- O terceiro diz respeito a abotoaduras com 48 diamantes;
- E o quarto é um relógio de 33 rubis que faz parte de uma edição limitada de apenas 25 peças.
Certificado de autenticidade de joia Chopard encontrado em troca de e-mails de Mauro Cid — Foto: Reprodução
Os certificados mostram que as três primeiras joias foram adquiridas em 17 de outubro de 2021, nove dias antes do primeiro conjunto de joias ter sido retido pela Receita. Apenas o relógio foi comprado antes, em 16 de março de 2019.
As compras ocorreram na loja Attar United, uma revendedora autorizada da Chopard na Arábia Saudita. O carimbo permite ver que a aquisição foi em Riad, a capital do país.
No site da Chopard, a partir da numeração de série, é possível encontrar imagens e detalhes das peças.
Nove dias depois, em 28 de dezembro de 2022, outras trocas de e-mails apontam para o planejamento da tentativa de retirada do primeiro conjunto de joias, no Aeroporto de Guarulhos. Na data da apreensão, esse conjunto foi avaliado em 5,6 milhões de reais.
Mauro Cid durante depoimento na CPI dos Atos Golpistas — Foto: Geraldo Magela/Agência Senado
Um auxiliar de Cid, o segundo-tenente Cleiton Henrique Holzschuk, na época coordenador administrativo da Ajudância de Ordens, encaminha um ofício, segundo ele por ordem de Cid, para o então chefe da Receita Federal, Julio Cesar Vieira Gomes.
“Atendendo demanda recebida do Chefe da Ajudância de Ordens do Presidente da República, Ten Cel EB MAURO CESAR BARBOSA CID, encaminho o Ofício anexo para conhecimento e providências.”
O blog já tinha revelado o conteúdo do ofício. Nele, Mauro Cid determina que um conjunto de joias contendo “colar, par de brincos, anel e relógio de pulso, conforme certificado de autenticidade Chopard”, seja retirado por um militar chamado Jairo, que também trabalhava para a Ajudância de Ordens.
Ofício do gabinete pessoal do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) tenta reaver as joias apreendidas no aeroporto de Guarulhos — Foto: Reprodução
Uma hora depois, às 13h38, o próprio Mauro Cid reencaminha o email de Holzschuk para o chefe da Receita Federal. Dessa vez, sem texto novo.
Não há nos emails compartilhados com a CPI registros de que as mensagens tenham sido respondidas.
Mas algumas horas depois, às 17h01, Holzschuk informa Cid que o militar designado para retirar as joias viajará para Guarulhos em voo da FAB:
E pede autorização para a compra de um voo comercial para ele retornar a Brasília com as joias.
“Solicito-vos autorizar o 1º Sgt MB JAIRO (…), desta Ajudância de Ordens, retornar em voo comercial no trecho Guarulhos-SP para Brasília-DF em 29 de dezembro de 2022. “
Cid autoriza:
“Está autorizado a retornar em voo comercial no trecho Guarulhos-SP para Brasília-DF em 29 de dezembro de 2022.”
Os novos emails serão analisados pelos integrantes da CPI dos Atos Golpistas, que analisam também o uso da Ajudância de Ordens para interesses privados. Há requerimentos pedindo a reconvocação de Cid que, quando prestou depoimento, se manteve em silêncio.
Em nota, o Ministério de Minas e Energia informou que “a questão já está sendo investigada pelos órgãos responsáveis – Polícia Federal, Ministério Público Federal e Receita Federal –, que contam com ampla e irrestrita colaboração da atual gestão desta pasta”.
A defesa de Julio Cesar Vieira Gomes disse que a única coisa que o então chefe da Receita Federal fez foi “requerer que as equipes técnicas da Receita Federal avaliassem se era cabível o pedido de incorporação das joias ao acervo da Presidência da República. As equipes concluíram que, da forma como o pedido foi formalizado, a incorporação não poderia ser concretizada e, com essa informação, o processo foi encerrado”. Afirmou ainda que: “só soube que existia depois que o assunto veio à tona, já em 2023”.